quinta-feira, 11 de junho de 2009

Porque eu sei que é amor

Porque eu sei que é amor
Eu não peço nada em troca
Porque eu sei que é amor
Eu não peço nenhuma prova

Mesmo que você não esteja aqui
O amor está aqui
Agora
Mesmo que você tenha que partir
O amor não há de ir
Embora

Eu sei que é pra sempre
Enquanto durar
E eu peço somente
O que eu puder dar

Porque eu sei que é amor
Sei que cada palavra importa
Porque eu sei que é amor
Sei que só há uma resposta

Mesmo sem porquê eu te trago aqui
O amor está aqui
Comigo
Mesmo sem porquê eu te levo assim
O amor está em mim
Mais vivo

Porque eu sei que é amor.


(Sérgio Britto / Paulo Miklos)

Deixa eu sangrar

Deixe a luz acesa
O ar ficou mais puro
Onde houve beleza
Ficou dito tudo...

Flores, frases feitas
O meu mundo é outro lugar
Só uma certeza
Faça este dia acordar
A vida se dar
Reafirmar o que vimos juntos

E te ter aqui

Deixa eu sangrar ao menos
Deixa eu chorar então
Deixa eu sangrar ao menos
Deixa eu perder a ilusão
Deixa eu sangrar ao menos
Deixa eu chorar então
Restam a noite, os ventos
E as coisas como são

O teu melhor vestido
Hoje nada mais vai servir
Fique aqui comigo
Abra os olhos, venha assistir
O mundo girar
Ver passar cada segundo

E te deixar ir.


(Sérgio Britto)

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Sacos Plásticos

Eu quero ser
Um desses sacos plásticos
Que você traz do supermercado
Eu posso ser
Um desses automóveis
Nesse trânsito congestionado

Me deixa ser seu lixo
Seus dejetos, qualquer desses objetos
Sem utilidade
Que você vai levar
Pela eternidade

Vou entrar na sua vida
Você não vai viver sem mim
Vou estar por todo lado
No seu mundo até o fim

Eu quero ser um desses gases tóxicos
Que se prendem na atmosfera
Eu posso ser um desses conservantes
Que contaminam a vida pela terra

Me deixa ser seu erro
Seus tormentos, qualquer desses sentimentos
Que tiram o seu sono
E vão tomar o lugar
Dos seus sonhos

Eu quero ser aquele spray de cabelo
Que você usa de um jeito bizarro
Eu posso ser aquela nicotina
Que envenena o seu cigarro

Me deixa ser seu medo
Seus problemas
Qualquer desses teoremas
Que não tem resposta
E você vai saber
Que não tem mais volta.


(Branco Mello / Paulo Miklos)

Amor por dinheiro

Acima dos homens, a lei
E acima da lei dos homens
A lei de Deus

Acima dos homens, o céu
E acima do céu dos homens
O nome de Deus

E acima da lei de Deus
O dinheiro!

Que mata, salva, compra amor verdadeiro
Que suja, limpa, compra amor por inteiro

Amor verdadeiro
Dinheiro, amor por dinheiro!


(Sérgio Britto / Tony Bellotto)

terça-feira, 9 de junho de 2009

Hoje eu te pedi em casamento

E eu falei,
Contra toda a granada disparada
Pela minha ansiedade
E a fragilidade e a insegurança
Sobre toda a vontade desenhada
Pela minha intensidade
E a ingenuidade de uma criança
Que é você que eu quero
Com você eu quero me casar.

E eu farei,
Contra toda a risada e a maldade
Que minha imbecilidade
Deixou margem pra desconfiança.
Contra todo o mau olhado e a inveja
De quem não se basta, sobra na irrelevância
Pois é você que eu quero
Pra você eu quero me entregar

Assim
Ruivo e do meu tamanho
Assim
Míope e descabelado
Assim
Louco e apaixonado
Extrovertido
Quente
Diferente
Ardente
Tímido
Original.

E eu darei
O conforto e a tranqüilidade
Que uma tarde ensolarada
Na cidade de São Paulo
Vem com importância
O consolo dos meus ombros
Se as lágrimas molharem o seu rosto
Que as sardas
Enfeitaram com elegância
Se é você que eu quero
Pois você consegue me acalmar.


(Nando Reis)

Só pra Sô

Sophia
O seu sorriso é um horizonte
Seus olhos criam um universo
O charme do teu ombro esconde
A surpresa o teu mistério

Sophia
Você é a própria novidade
Que atualiza o que te cerca
O sangue que passeia na avenida
Ida e vinda , veia e artéria

Sofria vendo eu me destruir
Sem conseguir me parar
Sofri vendo você pedir
As coisas que eu não pude dar
Sofreu mais do que deveria
Sofro a cada vez que te faço chorar

Sophia
Meu medo é te ver machucada
Errei por ter te machucado
Seu pai é um homem indomável
Um provável homem doce

Sophia
Me assusta tão igual que somos
Você costura a minha sombra
Eu só queria nessa vida
Aprender saber te amar.


(Nando Reis)

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Conta

Desde o dia que perdi minha mãe
Eu me perdi de mim também
Perdi no mundo o que era o mundo meu
- minha mãe
E eu não sei o que sou sem ela
Só sei que ela me deixou
Por que ela me deixou?
Por que ela me deixou?
Ela me deixou
Por que ela me deixou?

Nesse dia, o dia em que eu perdi minha mãe
Eu me dei conta que eu estava só por minha conta
Mesmo tendo o meu pai, esse que eu amo
A minha conta não fecha
Essa conta nunca mais fechou
Nunca mais fechou
Nunca mais fechou
Essa conta não se fecha
Nunca mais fechou

Estou aqui, estou aqui, fiquei aqui
Você não está, você não está, não está mais
Eu quero te ver, quero te ver, para te ver
É preciso sonhar.

E a partir desse dia, desse dia em diante
Minha alegria se transformou
Minha família aumentou bastante
Sou pai de cinco filhos
Mas um filho-pai apenas, criança sou
Uma criança sou
Uma criança sou.


(Nando Reis)

Drês

Três dias atrás
Tudo era diferente
Três dias pra frente
Nada vai ficar igual
E eu tenho medo

É longe demais
Leva muito tempo
Ficou aqui dentro
Não some nunca mais
Foi muito cedo

Somos vegetais
Da flor a semente
Há pedra na gente
Efervescentes minerais
De ouro e vento

Terrenos mortais
Eternos no presente
Impérios latentes
dos tempos ancestrais
sonho e segredo

Três dias a mais
Todos drês e urgentes
Três dias somente
Poucos mas fundamentais
Eu te desejo


(Nando Reis)

domingo, 7 de junho de 2009

Vestibular

Paulo Roberto Parreiras
desapareceu de casa
trajava calças cinza e camisa branca
e tinha dezesseis anos.
Parecia com teu filho, teu irmão,
teu sobrinho,
parecia com o filho do vizinho,
mas não era.
Era Paulo Roberto Parreiras
que não passou no vestibular.

Recebeu a notícia quinta-feira à tarde,
ficou triste
e sumiu.
De vergonha? De raiva?
Paulo Roberto estudou
dura duramente
durante os últimos meses.
Deixou de lado os discos,
o cinema,
até a namoradinha ficou sem vê-lo.
Nem soube do carnaval.
Se ele fez bem ou mal
não sei:queria passar no vestibular.
Não passou.
Não basta estudar?

Paulo Roberto Parreira
a quem nunca vi mais gordo,
onde quer que você esteja
fique certo
de que estamos do seu lado.
Sei que isso é muito pouco
para quem estudou tanto
e não foi classificado(pois não há mais
excedentes),
mas é o que lhe posso oferecer:minha palavra de amigo desconhecido.
Nessa mesma quinta-feira,
em Nova York, morreu
um menino de treze anos que tomava entorpecentes.
Em São Paulo,outro garoto
foi preso roubando carros.
E há muitos que somem
ou surgem como cometas ardendo em sangue,nestas noites,
nestas tardes,
nesses dias amargos.

Não sei pra onde você foi
nem o que pretende fazer
nem posso dizer que volte para casa.
Estude(mais?) e tente outra vez.
Não tenho nenhum poder,
nada posso assegurar.
Tudo que posso dizer-lhe
é que a gente não foge da vida,
é que não adianta fugir.
Nem adianta endoidar.
Tudo o que posso dizer-lhe
é que você tem o direito de estudar.
É justa sua revolta:
seu outro vestibular.


(Ferreira Gullar)

Nós, Latino-Americanos

Somos todos irmãos
mas não porque tenhamos
a mesma mãe e o mesmo pai:
temos é o mesmo parceiro
que nos trai.

Somos todos irmãos
não porque dividamos
o mesmo teto e a mesma mesa:
divisamos a mesma espada
sobre nossa cabeça.

Somos todos irmãos
não porque tenhamos
o mesmo berço, o mesmo sobrenome:
temos um mesmo trajeto
de sanha e fome.

Somos todos irmãos
não porque seja o mesmo sangue
que no corpo levamos:
o que é o mesmpo é o modo
como o derramamos.


(Ferreira Gullar)

sábado, 6 de junho de 2009

Clic

Cidadão se descuidou e roubaram seu celular. Como era um executivo e não sabia mais viver sem celular, ficou furioso. Deu parte do roubo, depois teve uma idéia. Ligou para o número do telefone. Atendeu uma mulher.

— Aloa.

— Quem fala?

— Com quem quer falar?

— O dono desse telefone.

— Ele não pode atender.

— Quer chamá-lo, por favor?

— Ele esta no banheiro. Eu posso anotar o recado?

— Bate na porta e chama esse vagabundo agora.

Clic. A mulher desligou. O cidadão controlou-se. Ligou de novo.

— Aloa.

— Escute. Desculpe o jeito que eu falei antes. Eu preciso falar com ele, viu? É urgente.

— Ele já vai sair do banheiro.

— Você é a...

— Uma amiga.

— Como é seu nome?

— Quem quer saber?

O cidadão inventou um nome.

— Taborda. (Por que Taborda, meu Deus?) Sou primo dele.

— Primo do Amleto?

Amleto. O safado já tinha um nome.

— É. De Quaraí.

— Eu não sabia que o Amleto tinha um primo de Quaraí.

— Pois é.

— Carol.

— Hein?

— Meu nome. É Carol.

— Ah. Vocês são...

— Não, não. Nos conhecemos há pouco.

— Escute Carol. Eu trouxe uma encomenda para o Amleto. De Quaraí. Uma pessegada, mas não me lembro do endereço.

— Eu também não sei o endereço dele.

— Mas vocês...

— Nós estamos num motel. Este telefone é celular.

— Ah.

— Vem cá. Como você sabia o número do telefone dele? Ele recém-comprou.

— Ele disse que comprou?

— Por que?

O cidadão não se conteve.

— Porque ele não comprou, não. Ele roubou. Está entendendo? Roubou. De mim!

— Não acredito.

— Ah, não acredita? Então pergunta pra ele. Bate na porta do banheiro e pergunta.

— O Amleto não roubaria um telefone do próprio primo.

E Carol desligou de novo.

O cidadão deixou passar um tempo, enquanto se recuperava. Depois ligou.

— Aloa.

— Carol, é o Tobias.

— Quem?

— O Taborda. Por favor, chame o Amleto.

— Ele continua no banheiro.

— Em que motel vocês estão?

— Por que?

— Carol, você parece ser uma boa moça. Eu sei que você gosta do Amleto...

— Recém nos conhecemos.

— Mas você simpatizou. Estou certo? Você não quer acreditar que ele seja um ladrão. Mas ele é, Carol. Enfrente a realidade. O Amleto pode Ter muitas qualidades, sei lá. Há quanto tempo vocês saem juntos?

— Esta é a primeira vez.

— Vocês nunca tinham se visto antes?

— Já, já. Mas, assim, só conversa.

— E você nem sabe o endereço dele, Carol. Na verdade você não sabe nada sobre ele. Não sabia que ele é de Quaraí.

— Pensei que fosse goiano.

— Ai esta, Carol. Isso diz tudo. Um cara que se faz passar por goiano...

— Não, não. Eu é que pensei.

— Carol, ele ainda está no banheiro?

— Está.

— Então sai daí, Carol. Pegue as suas coisas e saia. Esse negocio pode acabar mal. Você pode ser envolvida. — Saia daí enquanto é tempo, Carol!

— Mas...

— Eu sei. Você não precisa dizer. Eu sei. Você não quer acabar a amizade. Vocês se dão bem, ele é muito legal. Mas ele é um ladrão, Carol. Um bandido. Quem rouba celular é capaz de tudo. Sua vida corre perigo.

— Ele esta saindo do banheiro.

— Corra, Carol! Leve o telefone e corra! Daqui a pouco eu ligo para saber onde você está.

Clic.

Dez minutos depois, o cidadão liga de novo.

— Aloa.

— Carol, onde você está?

— O Amleto está aqui do meu lado e pediu para lhe dizer uma coisa.

— Carol, eu...

— Nós conversamos e ele quer pedir desculpas a você. Diz que vai devolver o telefone, que foi só brincadeira. Jurou que não vai fazer mais isso.

O cidadão engoliu a raiva. Depois de alguns segundos falou:

— Como ele vai devolver o telefone?

— Domingo, no almoço da tia Eloá. Diz que encontra você lá.

— Carol, não...

Mas Carol já tinha desligado.

O cidadão precisou de mais cinco minutos para se recompor. Depois ligou outra vez.

—Aloa.

Pelo ruído o cidadão deduziu que ela estava dentro de um carro em movimento.

— Carol, é o Torquatro.

— Quem?

— Não interessa! Escute aqui. Você está sendo cúmplice de um crime. Esse telefone que você tem na mão, esta me entendendo? Esse telefone que agora tem suas impressões digitais. É meu! Esse salafrário roubou meu celular!

— Mas ele disse que vai devolver na...

— Não existe Tia Eloá nenhuma! Eu não sou primo dele. Nem conheço esse cafajeste. Ele esta mentindo para você, Carol.

— Então você também mentiu!

— Carol...

Clic.

Cinco minutos depois, quando o cidadão se ergueu do chão, onde estivera mordendo o carpete, e ligou de novo, ouviu um "Alô" de homem.

— Amleto?

— Primo! Muito bem. Você conseguiu, viu? A Carol acaba de descer do carro.

— Olha aqui, seu...

— Você já tinha liquidado com o nosso programa no motel, o maior clima e você estragou, e agora acabou com tudo. Ela está desiludida com todos os homens, para sempre. Mandou parar o carro e desceu. Em plena Cavalhada. Parabéns primo. Você venceu. Quer saber como ela era?

— Só quero meu telefone.

— Morena clara. Olhos verdes. Não resistiu ao meu celular. Se não fosse o celular, ela não teria topado o programa. E se não fosse o celular, nós ainda estaríamos no motel. Como é que chama isso mesmo? Ironia do destino?

— Quero meu celular de volta!

— Certo, certo. Seu celular. Você tem que fechar negócios, impressionar clientes, enganar trouxas. Só o que eu queria era a Carol...

— Ladrão

— Executivo

— Devolve meu...

Clic.

Cinco minutos mais tarde. Cidadão liga de novo. Telefone toca várias vezes. Atende uma voz diferente.

— Ahn?

— Quem fala?

— É o Trola.

— Como você conseguiu esse telefone?

— Sei lá. Alguém jogou pela janela de um carro. Quase me acertou.

— Onde você está?

— Como eu estou? Bem, bem. Catando meus papéis, sabe como é. Mas eu já fui de circo. É. Capitão Trovar. Andei até pelo Paraguai.

— Não quero saber de sua vida. Estou pagando uma recompensa por este telefone. Me diga onde você está que eu vou buscar.

— Bem. Fora a Dalvinha, tudo bem. Sabe como é mulher. Quando nos vê por baixo, aproveita. Ontem mesmo...

— Onde você está? Eu quero saber onde!

— Aqui mesmo, embaixo do viaduto. De noitinha. Ela chegou com o índio e o Marvão, os três com a cara cheia, e...


(Luis Fernando Verissimo)

Homem que é homem

Homem que é Homem não usa camiseta sem manga, a não ser para jogar basquete. Homem que é Homem não gosta de canapés, de cebolinhas em conserva ou de qualquer outra coisa que leve menos de 30 segundos para mastigar e engolir. Homem que é Homem não come suflê. Homem que é Homem — de agora em diante chamado HQEH — não deixa sua mulher mostrar a bunda para ninguém, nem em baile de carnaval. HQEH não mostra a sua bunda para ninguém. Só no vestiário, para outros homens, e assim mesmo, se olhar por mais de 30 segundos, dá briga.

HQEH só vai ao cinema ver filme do Franco Zeffirelli quando a mulher insiste muito, e passa todo o tempo tentando ver as horas no escuro. HQEH não gosta de musical, filme com a Jill Clayburgh ou do Ingmar Bergman. Prefere filmes com o Lee Marvin e Charles Bronson. Diz que ator mesmo era o Spencer Tracy, e que dos novos, tirando o Clint Eastwood, é tudo veado.

HQEH não vai mais a teatro porque também não gosta que mostrem a bunda à sua mulher. Se você quer um HQEH no momento mais baixo de sua vida, precisa vê-lo no balé. Na saída ele diz que até o porteiro é veado e que se enxergar mais alguém de malha justa, mata.

E o HQEH tem razão. Confesse, você está com ele. Você não quer que pensem que você é um primitivo, um retrógrado e um machista, mas lá no fundo você torce pelo HQEH. Claro, não concorda com tudo o que ele diz. Quando ele conta tudo o que vai fazer com a Feiticeira no dia em que a pegar, você sacode a cabeça e reflete sobre o componente de misoginia patológica inerente à jactância sexual do homem latino. Depois começa a pensar no que faria com a Feiticeira se a pegasse. Existe um HQEH dentro de cada brasileiro, sepultado sob camadas de civilização, de falsa sofisticação, de propaganda feminina e de acomodação. Sim, de acomodação. Quantas vezes, atirado na frente de um aparelho de TV vendo a novela das 8 — uma história invariavelmente de humilhação, renúncia e superação femininas — você não se perguntou o que estava fazendo que não dava um salto, vencia a resistência da família a pontapés e procurava uma reprise do Manix em outro canal? HQEH só vê futebol na TV. Bebendo cerveja. E nada de cebolinhas em conserva! HQEH arrota e não pede desculpas.

*

Se você não sabe se tem um HQEH dentro de você, faça este teste. Leia esta série de situações. Estude-as, pense, e depois decida como você reagiria em cada situação. A resposta dirá o seu coeficiente de HQEH. Se pensar muito, nem precisa responder: você não é HQEH. HQEH não pensa muito!


Situação 1


Você está num restaurante com nome francês. O cardápio é todo escrito em francês. Só o preço está em reais. Muitos reais. Você pergunta o que significa o nome de um determinado prato ao maître. Você tem certeza que o maître está se esforçando para não rir da sua pronúncia. O maître levará mais tempo para descrever o prato do que você para comê-lo, pois o que vem é uma pasta vagamente marinha em cima de uma torrada do tamanho aproximado de uma moeda de um real, embora custe mais de cem. Você come de um golpe só, pensando no que os operários são obrigados a comer. Com inveja. Sua acompanhante pergunta qual é o gosto e você responde que não deu tempo para saber. 0 prato principal vem trocado. Você tem certeza que pediu um "Boeuf à quelque chose" e o que vem é uma fatia de pato sem qualquer acompanhamento. Só. Bem que você tinha notado o nome: "Canard melancolique". Você a princípio sente pena do pato, pela sua solidão, mas muda de idéia quando tenta cortá-lo. Ele é um duro, pode agüentar. Quando vem a conta, você nota que cobraram pelo pato e pelo "boeuf' que não veio. Você: a) paga assim mesmo para não dar à sua acompanhante a impressão de que se preocupa com coisas vulgares como o dinheiro, ainda mais o brasileiro; b) chama discretamente o maître e indica o erro, sorrindo para dar a entender que, "Merde, alors", estas coisas acontecem; ou c) vira a mesa, quebra uma garrafa de vinho contra a parede e, segurando o gargalo, grita: "Eu quero o gerente e é melhor ele vir sozinho!


Situação 2


Você foi convencido pela sua mulher, namorada ou amiga — se bem que HQEH não tem "amigas", quem tem "amigas" é veado — a entrar para um curso de Sensitivação Oriental. Você reluta em vestir a malha preta, mas acaba sucumbindo. O curso é dado por um japonês, provavelmente veado. Todos sentam num círculo em volta do japonês, na posição de lótus. Menos você, que, como está um pouco fora de forma, só pode sentar na posição do arbusto despencado pelo vento.

Durante 15 minutos todos devem fechar os olhos, juntar as pontas dos dedos e fazer "rom", até que se integrem na Grande Corrente Universal que vem do Tibete, passa pelas cidades sagradas da Índia e do Oriente Médio e, estranhamente, bem em cima do prédio do japonês, antes de voltar para o Oriente. Uma vez atingido este estágio, todos devem virar para a pessoa ao seu lado e estudar seu rosto com as pontas dos dedos. Não se surpreendendo se o japonês chegar por trás e puxar as suas orelhas com força para lembrá-lo da dualidade de todas as coisas. Durante o "rom" você faz força, mas não consegue se integrar na grande corrente universal, embora comece a sentir uma sensação diferente que depois revela-se ser câimbra. Você: a) finge que atingiu a integração para não cortar a onda de ninguém; b) finge que não entendeu bem as instruções, engatinha fazendo "rom" até o lado daquela grande loura e, na hora de tocar o seu rosto, erra o alvo e agarra os seios, recusando-se a soltá-los mesmo que o japonês quase arranque as suas orelhas; c) diz que não sentiu nada, que não vai seguir adiante com aquela bobagem, ainda mais de malha preta, e que é tudo coisa de veado.


Situação 3


Você está numa daquelas reuniões em que há lugares de sobra para sentar, mas todo mundo senta no chão. Você não quis ser diferente, se atirou num almofadão colorido e tarde demais descobriu que era a dona da casa. Sua mulher ou namorada está tendo uma conversa confidencial, de mãos dadas, com uma moça que é a cara do Charlton Heston, só que de bigode. O jantar é à americana e você não tem mais um joelho para colocar o seu copo de vinho enquanto usa os outros dois para equilibrar o prato e cortar o pedaço de pato, provavelmente o mesmo do restaurante francês, só que algumas semanas mais velho. Aí o cabeleireiro de cabelo mechado ao seu lado oferece:

— Se quiser usar o meu...

— O seu...?

— Joelho.

— Ah...

— Ele está desocupado.

— Mas eu não o conheço.

— Eu apresento. Este é o meu joelho.

— Não. Eu digo, você...

— Eu, hein? Quanta formalidade. Aposto que se eu estivesse oferecendo a perna toda você ia pedir referências. Ti-au.

Você: a) resolve entrar no espírito da festa e começa a tirar as calças; b) leva seu copo de vinho para um canto e fica, entre divertido e irônico, observando aquele curioso painel humano e organizando um pensamento sobre estas sociedades tropicais, que passam da barbárie para a decadência sem a etapa intermediária da civilização; ou c) pega sua mulher ou namorada e dá o fora, não sem antes derrubar o Charlton Heston com um soco.

Se você escolheu a resposta a para todas as situações, não é um HQEH. Se você escolheu a resposta b, não é um HQEH. E se você escolheu a resposta c, também não é um HQEH. Um HQEH não responde a testes. Um HQEH acha que teste é coisa de veado.

*

Este país foi feito por Homens que eram Homens. Os desbravadores do nosso interior bravio não tinham nem jeans, quanto mais do Pierre Cardin. O que seria deste pais se Dom Pedro I tivesse se atrasado no dia 7 em algum cabeleireiro, fazendo massagem facial e cortando o cabelo à navalha? E se tivesse gritado, em vez de "Independência ou Morte", "Independência ou Alternativa Viável, Levando em Consideração Todas as Variáveis!"? Você pode imaginar o Rui Barbosa de sunga de crochê? O José do Patrocínio de colant? 0 Tiradentes de kaftan e brinco numa orelha só? Homens que eram Homens eram os bandeirantes. Como se sabe, antes de partir numa expedição, os bandeirantes subiam num morro em São Paulo e abriam a braguilha. Esperavam até ter uma ereção e depois seguiam na direção que o pau apontasse. Profissão para um HQEH é motorista de caminhão. Daqueles que, depois de comer um mocotó com duas Malzibier, dormem na estrada e, se sentem falta de mulher, ligam o motor e trepam com o radiador. No futebol HQEH é beque central, cabeça-de-área ou centroavante. Meio-de-campo é coisa de veado. Mulher do amigo de Homem que é Homem é homem. HQEH não tem amizade colorida, que é a sacanagem por outros meios. HQEH não tem um relacionamento adulto, de confiança mútua, cada um respeitando a liberdade do outro, numa transa, assim, extraconjugal mas assumida, entende? Que isso é papo de mulher pra dar pra todo mundo. HQEH acha que movimento gay é coisa de veado.

HQEH nunca vai a vernissage.

HQEH não está lendo a Marguerite Yourcenar, não leu a Marguerite Yourcenar e não vai ler a Marguerite Yourcenar.

HQEH diz que não tem preconceito mas que se um dia estivesse numa mesma sala com todas as cantoras da MPB, não desencostaria da parede.

Coisas que você jamais encontrará em um HQEH: batom neutro para lábios ressequidos, pastilhas para refrescar o hálito, o telefone do Gabeira, entradas para um espetáculo de mímica.

Coisas que você jamais deve dizer a um HQEH: "Ton sur ton", "Vamos ao balé?", "Prove estas cebolinhas".

Coisas que você jamais vai ouvir um HQEH dizer: "Assumir", "Amei", "Minha porção mulher", "Acho que o bordeau fica melhor no sofá e a ráfia em cima do puf".

Não convide para a mesma mesa: um HQEH e o Silvinho.

HQEH acha que ainda há tempo de salvar o Brasil e já conseguiu a adesão de todos os Homens que são Homens que restam no país para uma campanha de regeneração do macho brasileiro.

Os quatro só não têm se reunido muito seguidamente porque pode parecer coisa de veado.


(Luis Fernando Verissimo)

sexta-feira, 5 de junho de 2009

O Verão e as Mulheres

Talvez tenha acabado o verão. Há um grande vento frio cavalgando as ondas, mas o céu está limpo e o sol é muito claro. Duas aves dançam sobre as espumas assanhadas. As cigarras não cantam mais. Talvez tenha acabado o verão.

Estamos tranqüilos. Fizemos este verão com paciência e firmeza, como os veteranos fazem a guerra. Estivemos atentos à lua e ao mar; suamos nosso corpo; contemplamos as evoluções de nossas mulheres, pois sabemos o quanto é perigoso para elas o verão.

Sim, as mulheres estão sujeitas a uma grande influência do verão; no bojo do mês de janeiro elas sentem o coração lânguido, e se espreguiçam de um modo especial; seus olhos brilham devagar, elas começam a dizer uma coisa e param no meio, ficam olhando as folhas das amendoeiras como se tivessem acabado de descobrir um estranho passarinho. Seus cabelos tornam-se mais claros e às vezes os olhos também; algumas crescem imperceptivelmente meio centímetro. Estremecem quando de súbito defrontam um gato; são assaltadas por uma remota vontade de miar; e certamente, quando a tarde cai, ronronam para si mesmas.

Entregam-se a redes; é sabido, ao longo de toda a faixa tropical do globo, que as mulheres não habituadas a rede e que nelas se deitam ao crepúsculo, no estio, são perseguidas por fantasias e algumas imaginam que podem voar de uma nuvem a outra nuvem com facilidade. Sendo embaladas, elas se comprazem nesse jogo passivo e às vezes tendem a se deixar raptar, por deleite ou preguiça.

Observei uma dessas pessoas na véspera do solstício, em 20 de dezembro, quando o sol ia atingindo o primeiro ponto do Capricórnio, e a acompanhei até as imediações do Carnaval. Sentia-se que ia acontecer algo, no segundo dia da lua cheia de fevereiro; sua boca estava entreaberta: fiz um sinal aos interessados, e ela pôde ser salva.

Se realmente já chegou o outono, embora não o dia 22, me avisem. Sucederam muitas coisas; é tempo de buscar um pouco de recolhimento e pensar em fazer um poema.

Vamos atenuar os acontecimentos, e encarar com mais doçura e confiança as nossas mulheres. As que sobreviveram a este verão.


(Rubem Braga)

O Jivaro

Um Sr. Matter, que fez uma viagem de exploração à América do Sul, conta a um jornal sua
conversa com um índio jivaro, desses que sabem reduzir a cabeça de um morto até ela ficar
bem pequenina. Queria assistir a uma dessas operações, e o índio lhe disse que exatamente
ele tinha contas a acertar com um inimigo.
O Sr. Matter:
- Não, não! Um homem, não. Faça isso com a cabeça de um macaco.
E o índio:
- Por que um macaco? Ele não me fez nenhum mal!


(Rubem Braga)

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Um Herói Que Mata

Pra ela eu sou perfeito
Eu sou algum pirata
Pra roubar teu sono
Um herói que mata

Eu sei que ela deseja
Que eu seja essa ameaça
A dose de coragem
A emoção que falta

E eu tenho tanto medo
Será que é tarde ou cedo
E eu me sinto dividido
Entre princípios e desejos

E ela tem tanto medo
E eu não sou nem metade
Da metade da metade
Do que eu quis ser de verdade

Gastei tempo em nada
Da forma errada
Mas deixei o melhor pro fim
Nem pirata
Nem, herói que mata
Pra você o melhor de mim

Enquanto eu brinco de pirata
De brinco e tatuagem
Eu quase viro escravo
Dessa personagem

Se ela encosta no meu peito
A cabeça no meu ombro
Sou eu que perco o sono
Pra ela eu sou perfeito

E a gente é tão pequeno
E acha que move o mundo
E se perde em vaidade
E se acha sempre tão profundo

Acho que todo medo
É de não ter segredo
Mas o segredo é não ter medo
De morrer por seus desejos.


(Leoni)

Do Teu Lado

Te escrevo essa canção
Pra te fazer companhia
Pra segurar tua mão
Não te deixar sozinha
Canção feita de pele
Pra usar por baixo da roupa
Canção pra te deixar um gosto doce na boca

Te escrevo essa canção
Porque nem sempre ando perto
E essa canção me ajuda a atravessar um deserto
Canção de fim de tarde
Pra se encontrar nos seus poros
Pra acordar com você
Te olhar no fundo dos olhos

Canção pra andar do teu lado
Em toda e qualquer cidade
Pra te cobrir de sorrisos
Quando eu chorar de saudade

Te escrevo essa canção
Pra te fazer companhia
Pra segurar tua mão
Não te deixar sozinha
Canção feita de pele
Pra usar por baixo da roupa
Canção pra te deixar um gosto doce na boca.


(Leoni)

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Se Não Agora, Quando?

Serei feliz quando juntar dinheiro
Der a volta ao mundo e mudar de emprego
Serei feliz quando estiver mais magro
E couber em qualquer roupa que estiver na moda
Serei feliz quando estiver respostas
Quando for famoso e me sentir seguro
Serei feliz quando ela for embora
Quando o meu país me parecer mais justo

Serei feliz quando a dor passar
Serei feliz em outro lugar
Serei feliz quando você ligar
A sorte é que tem sempre alguém pra me lembrar

Que agora é o futuro
Que eu andava esperando
Agora é o futuro
Se não agora, quando?

Serei feliz quando eu tiver dezoito
Sair de casa e comprar um carro
Serei feliz quando aos trinta e poucos
Comprar a minha casa e a vida for mais clara
Serei feliz quando um verso meu
Te fizer chorar e perder a fala
Serei feliz quando eu abrir a porta
E encontrar os meus problemas arrumando a mala

Serei feliz quando o sol nascer
Serei feliz quando Deus quiser
Serei feliz quando merecer
Mas escrevo pelos muros pra não me esquecer

Que agora é o futuro
Que eu andava esperando
Agora é o futuro
Se não agora, quando?


(George Israel / Leoni / Luciana Fregolente)

Os Amadores

Não era esse o meu plano
Mas o que aconteceu?
Eu sei que tinha um sentido
Alguma coisa mais clara
que escureceu
Ou que ficou no caminho


A minha coleção de sonhos perdidos
É quase nada, mas é tudo que eu carrego


Talvez um breve delírio
Que desapareceu
Só um retrato vazio
O meu futuro brilhante
Talvez não fosse meu
E agora eu ando perdido


Não sou só eu, ninguém entende direito
Porque é que tudo foi ficar desse jeito


Não há onde chegar
Nem um roteiro preciso
Nós somos amadores
Tudo aqui é improviso
Não sei se alguém mais sente
Isso que eu tenho sentido
A vida não parece ser o que ela poderia ter sido


Provavelmente fui eu
Que não compreendi
Ou alguém esqueceu de avisar
Que era melhor aceitar
Que a vida é o que é
Que a gente espera demais


Mas tem um peso que eu carrego no peito
Eu sinto falta do que eu nem sei direito.


(Leoni / Luciana Fregolente)

terça-feira, 2 de junho de 2009

A Viajante

Com franqueza, não me animo a dizer que você não vá.

Eu, que sempre andei no rumo de minhas venetas, e tantas vezes troquei o sossego de uma casa pelo assanhamento triste dos ventos da vagabundagem, eu não direi que fique.

Em minhas andanças, eu quase nunca soube se estava fugindo de alguma coisa ou caçando outra. Você talvez esteja fugindo de si mesma, e a si mesma caçando; nesta brincadeira boba passamos todos, os inquietos, a maior parte da vida — e às vezes reparamos que é ela que se vai, está sempre indo, e nós (às vezes) estamos apenas quietos, vazios, parados, ficando. Assim estou eu. E não é sem melancolia que me preparo para ver você sumir na curva do rio — você que não chegou a entrar na minha vida, que não pisou na minha barranca, mas, por um instante, deu um movimento mais alegre à corrente, mais brilho às espumas e mais doçura ao murmúrio das águas. Foi um belo momento, que resultou triste, mas passou.

Apenas quero que dentro de si mesma haja, na hora de partir, uma determinação austera e suave de não esperar muito; de não pedir à viagem alegrias muito maiores que a de alguns momentos. Como este, sempre maravilhoso, em que no bojo da noite, na poltrona de um avião ou de um trem, ou no convés de um navio, a gente sente que não está deixando apenas uma cidade, mas uma parte da vida, uma pequena multidão de caras e problemas e inquietações que pareciam eternos e fatais e, de repente, somem como a nuvem que fica para trás. Esse instante de libertação é a grande recompensa do vagabundo; só mais tarde ele sente que uma pessoa é feita de muitas almas, e que várias, dele, ficaram penando na cidade abandonada. E há também instantes bons, em terra estrangeira, melhores que o das excitações e descobertas, e as súbitas visões de belezas sonhadas. São aqueles momentos mansos em que, de uma janela ou da mesa de um bar, ele vê, de repente, a cidade estranha, no palor do crepúsculo, respirar suavemente como velha amiga, e reconhece que aquele perfil de casas e chaminés já é um pouco, e docemente, coisa sua.

Mas há também, e não vale a pena esconder nem esquecer isso, aqueles momentos de solidão e de morno desespero; aquela surda saudade que não é de terra nem de gente, e é de tudo, é de um ar em que se fica mais distraído, é de um cheiro antigo de chuva na terra da infância, é de qualquer coisa esquecida e humilde - torresmo, moleque passando na bicicleta assobiando samba, goiabeira, conversa mole, peteca, qualquer bobagem. Mas então as bobagens do estrangeiro não rimam com a gente, as ruas são hostis e as casas se fecham com egoísmo, e a alegria dos outros que passam rindo e falando alto em sua língua dói no exilado como bofetadas injustas. Há o momento em que você defronta o telefone na mesa da cabeceira e não tem com quem falar, e olha a imensa lista de nomes desconhecidos com um tédio cruel.

Boa viagem, e passe bem. Minha ternura vagabunda e inútil, que se distribui por tanto lado, acompanha, pode estar certa, você.


(Rubem Braga)

O Desaparecido

Tarde fria, e então eu me sinto um daqueles velhos poetas de antigamente que sentiam frio na alma quando a tarde estava fria, e então eu sinto uma saudade muito grande, uma saudade de noivo, e penso em ti devagar, bem devagar, com um bem-querer tão certo e limpo, tão fundo e bom que parece que estou te embalando dentro de mim.

Ah, que vontade de escrever bobagens bem meigas, bobagens para todo mundo me achar ridículo e talvez alguém pensar que na verdade estou aproveitando uma crônica muito antiga num dia sem assunto, uma crônica de rapaz; e, entretanto, eu hoje não me sinto rapaz, apenas um menino, com o amor teimoso de um menino, o amor burro e comprido de um menino lírico. Olho-me no espelho e percebo que estou envelhecendo rápida e definitivamente; com esses cabelos brancos parece que não vou morrer, apenas minha imagem vai-se apagando, vou ficando menos nítido, estou parecendo um desses clichês sempre feitos com fotografias antigas que os jornais publicam de um desaparecido que a família procura em vão.

Sim, eu sou um desaparecido cuja esmaecida, inútil foto se publica num canto de uma página interior de jornal, eu sou o irreconhecível, irrecuperável desaparecido que não aparecerá mais nunca, mas só tu sabes que em alguma distante esquina de uma não lembrada cidade estará de pé um homem perplexo, pensando em ti, pensando teimosamente, docemente em ti, meu amor.


(Rubem Braga)

segunda-feira, 1 de junho de 2009

A Bailarina e O Soldado De Chumbo

De repente toda mágica se acabou
E na nossa casinha apertada
Tá faltando graça e tá sobrando espaço
Tô sobrando num sobrado sem ventilador

Vai dizer que nossas preces não alcançaram o céu?
Coração, que ainda vem me perguntar o que aconteceu
Conta se seu rosto por acaso ainda tem o gosto meu

Com duas conchas nas mãos,
Vem vestida de ouro e poeira
Falando de um jeito maneira
Da lua, da estrela e de um certo mal
Que agora acompanha teu dia
E pra minha poesia é o ponto final
É o ponto em que recomeço,
Recanto e despeço da magia que balança o mundo

Bailarina, soldado de chumbo
Bailarina, soldado de chumbo
Beijo e dor...
Bailarina, soldado de chumbo

Nossa casinha pequena
Parece vazia sem o teu balé
Sem teu café requentado
Soldado de chumbo não fica de pé.


(Fernando Anitelli)

Cuida de Mim

Pra falar verdade, às vezes minto
Tentando ser metade do inteiro que eu sinto
Pra dizer, as vezes que às vezes não digo
Sou capaz de fazer da minha briga, meu abrigo
Tanto faz, não satisfaz o que preciso
Além do mais, quem busca nunca é indeciso
Eu busquei quem sou;
Você, pra mim, mostrou
Que eu não sou sozinho nesse mundo.

Cuida de mim, enquanto não esqueço de você
Cuida de mim, enquanto finjo que sou quem eu queria ser.
Cuida de mim, enquanto não me esqueço de você
Cuida de mim, enquanto finjo, enquanto finjo, enquanto fujo.

Basta as penas que eu mesmo sinto de mim
Junto todas, crio asas, viro querubim
Sou da cor, do tom, sabor e som que quiser ouvir
Sou calor, clarão e escuridão que te faz dormir
Quero mais, quero a paz que me prometeu
Volto atrás, se voltar atrás, assim como eu.

Busquei quem sou
Você, pra mim, mostrou
Que eu não sou sozinho nesse mundo.


(Fernando Anitelli)

domingo, 31 de maio de 2009

Eu Não Tenho Nada A Ver Com Isso

Eu não tenho nada a ver com isso
Nem sequer nasci em Niterói
Não me chamo João
E não tenho, não
Qualquer vocação pra ser herói
Venho de três raças muito tristes
E eis por que o viver tanto me dói

Deito em minha rede
Mato a minha sede
Quanta mulher nua na Playboy!
Porém daqui a uns anos mais
Vão ser cem milhões
Cem milhões só de Pelés
E de violões
Que país mais tão feliz!

Deixa o Brasil andar
As estatísticas revelam:
No ano dois mil
Todo mundo vai ser jovem
No meu Brasil

Reparou como é que eu
Ando sutil demais?


(Vinicius de Moraes / Toquinho)

Samba da Volta

Você voltou, meu amor
Alegria que me deu
Quando a porta abriu você me olhou
Você sorriu, ah, você se derreteu
E se atirou, me envolveu, nem brincou
Conferiu o que era seu
É verdade eu reconheço
Eu tantas fiz, mas agora tanto faz
O perdão pediu seu preço, meu amor
Eu te Amo e Deus é mais.


(Vinicius de Moraes / Toquinho)

sábado, 30 de maio de 2009

Uma rosa em minha mão

Procurei um lugar
Com meu céu e meu mar
Não achei
Procurei o meu par
Só desgosto e pensar, encontrei

Onde anda o meu rei
Que me deixa tão só por aí
A quem tanto busquei
E de tanto que andei me perdi
Quem me dera encontrar
Ter meu céu, ter meu mar
Ter meu chão
Ver meu campo florir
E uma rosa se abrir na minha mão.


(Vinicius de Moraes / Toquinho)

Estamos aí

Estamos aí
Gente amiga que muito se quer
Estamos aí
Pro que der e vier
Estamos aí
Pro amor e pra desilusão
Mas como é bom cantar
Musiplicar
A magia de cada canção

Música
Como é bom cantar
Música
Deixa pensar que pra amar é preciso fingir
Deixa dizer que é preciso mentir
Deixa falar que a poesia não pode existir

Deixa pra lá
Estamos aí.


(Vinicius de Moraes / Tom Jobim / Chico Buarque / Toquinho)

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Grande Hotel

Vens ao meu quarto de hotel
Sem te anunciares sequer
Com certeza esqueceste que és
Que és uma senhora
Vejo-te andar de tailleur
Atravessando a novela
Sentes prazer em falar
De sentimentos de outrora


Deito-me no canapé
Não sem antes abrir a janela
E ver tuas palavras ao léu
Jogas conversa fora
Sabes que estive a teus pés
Sei que serás sempre aquela
Pretendes me complicar
Mas passou a nossa hora


Não me incomodo que fumes
Podes mesmo te servir à vontade do meu frigobar
Ou levar um souvenir
Dispõe do meu telefone
Desejando, liga o interurbano pra qualquer lugar
E apaga a luz ao sair


Quando eu pensava em dormir
Tu chegas vestida de negro
Vens decidida a bulir
Com quem está posto em sossego
Entras com ares de atriz
Sabes que sou da platéia
Deves pensar que ando louco
Louco pra mudar de idéia, não?
Pensas que não sou feliz
Entras com roupa de estréia
Deves saber que ando louco
Louco pra mudar de idéia.


(Chico Buarque / Wilson das Neves)

Você Não Ouviu

Você não ouviu
O samba que eu lhe trouxe
Ai, eu lhe trouxe rosas
Ai, eu lhe trouxe um doce
As rosas vão murchando
E o que era doce acabou-se

Você me desconserta
Pensa que está certa
Porém não se iluda
No fim do mês, quando o dinheiro aperta
Você corre esperta
E vem pedir ajuda
Eu lhe procuro, mas você se esconde
Não me diz aonde
Nem quer ver seu filho
No fim do mês é que você responde
E no primeiro bonde
Vem pedir auxílio

Você diz que minha rosa é frágil
Que o meu samba é plágio
E é só lugar comum
No fim do mês sei que você vem ágil
Passa um curto estágio
E eu fico sem nenhum
A sua dança vai durar enquanto
Você tem encanto
E não tem solidão
No fim da festa há de escutar meu canto
E vir correndo em pranto
Me pedir perdão (ou não?).


(Chico Buarque)

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Assim Sem Fim

Não finja um beijo que
Já não é mais seu
Nem diga que esse chão
Da casa, não é mais meu

Se tem algo a dizer
Que devolva em goles sãos
Qual é o tempo dessa solidão?
Aonde é o centro desse furacão?

Vestida de brisa assim
Sob meus olhos de Zeus
Que te acompanham então
Na casa, que adormeceu

Nem tem tanto a dizer
Mas trago ouvidos e pão
Na velocidade de amores vãos
Aonde termina nossa solidão

Se prepare para o que for
No raso do coração
O que ainda é meu
Não me devolva não

Sorte assim sem fim
Porque ninguém percebeu
As marcas de dentes
Aonde você mordeu
Me tem tanto a dizer
Que o tempo eu conto assim
Pra gente comer sentados no chão
Aonde termina esse furacão.


(Samuel Rosa / César Maurício)

Noites de Um Verão Qualquer

Noites de um verão qualquer
Eu me sufoco nesse ar
O corpo venta em preto
O chão devora o espaço ocular

Noites de um verão qualquer
Deixa que ela entenda o traço
Que invente a fuga por nós dois
Que sou seus pés, eu sou também seus braços

Noites de um verão qualquer
Dentro da febre desse abraço
Satélite voltou do céu
Eu sou o resto, sou também o aço

Noites de um verão qualquer
Sob sua pele encontrei abrigo
Pra gente se devorar
Na órbita do seu umbigo

Seguem infinitos metros
Pra perto desse abraço
Eu tento respirar
Desdar o nó que aperta esse laço.


(Samuel Rosa / César Maurício)

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Canção Áspera

Não espere nada
Seja o que for
Estou só de passagem
Breve é o amor

Não espere o dia
Deixe como está
Sigo essa miragem
Não sei a razão

Não espere nada
Deixa assim então
Sei que o mundo é oco
Menos que a paixão

Não sou nada disso
São desejos seus
Não será difícil
Breve é o adeus

Vim com minhas noites
Vou sem seu perdão
Sigo essa miragem
Não espere não

It's a lonely way
It's a rugged song
I woke up today
I knew it would be long

Estou em paz com minha guerra
E o tempo que passou veloz e devagar
Estou em paz na tempestade
E nada aqui parece ser o seu lugar.


(Samuel Rosa / Chico Amaral)

Pára-Raio

Passa o tempo, lento ensaio
Espero você aqui
Paro dentro, entro e saio
Falta você aqui

Calo invento, quieto falo
Trago você aqui
Lato intenso em detalhes
Quero você aqui

Abro e vejo da janela
Fogos de artifício
Estrelas em mosaico
Vidro opaco a luzir

Vasto imenso, feito em partes
Fácil para construir
Rasgo ao meio em metades
Acho você dentro de mim

Seu brinquedo imaginário
Feito pra te distrair
Paro dentro, entro e saio
Falta você aqui

Noite inteira, fim de tarde
Meu calendário marca o infinito
Em trincheiras que escavo
Acho você dentro de mim

Assim como o sal feito no mar
Azul como o céu e a imensidão
Que enche o pulmão de pleno ar
Achei seu lugar meu.


(Samuel Rosa / Nando Reis)

terça-feira, 26 de maio de 2009

Curtas do Millôr II

"O maior erro de Noé foi não ter matado as duas baratas que entraram na arca".

"Um homem é adulto no dia em que começa a gastar mais do que ganha".

"Roma não se fez num dia, mas o Rio foi destruído em dez anos".

"Não há pessoa mais chata do que você mesmo. Fuja da solidão".

"Eu posso não ser um bom exemplo. Mas sou um bom aviso".


(Millôr Fernandes)

Curtas do Millôr I

"Morrer, por exemplo, é uma coisa que se deve deixar sempre pra depois".

"Quando duas pessoas odeiam a mesma pessoa, têm a impressão de que se estimam".

"Idiota mesmo é o sujeito que, ouvindo uma história de duplo sentido, não entende nenhum dos dois".

"Já vi gente cansada de amor, de trabalho, de política, de ideais. Jamais conheci alguém sinceramente cansado de dinheiro".

"Grandes advogados conhecem muita jurisprudência. Advogados geniais conhecem muitos juízes".


(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Algo por Você

Hey, garota, não fique esperando o telefone tocar
Os homens são o que são e são todos iguais
O difícil é saber quem é clone de quem

Hey, garota, não fique esperando o telefone tocar
De volta ao passado, tecendo tapetes,
Esperando o guerreiro voltar

Já lhe fizeram sofrer demais
Já lhe fizeram feliz demais
Tá na hora de você mesma fazer
Algo por você
Só você pode fazer

Hey, garota, o dia já passou, não deixe a noite passar
Passe um batom, ou não, e vá se divertir
Você vai descobrir quem é clone de quem

Hey, garota, faça um favor: não fique esperando
Faça algo por você
Hey, garota, faça um favor: não fique esperando
Faça algo por você

E só você pode fazer.


(Humberto Gessinger)

Infinita Highway

Você me faz correr demais
Os riscos desta highway
Você me faz correr atrás
Do horizonte desta highway
Ninguém por perto, silêncio no deserto
Deserta highway
Estamos sós e nenhum de nós
Sabe exatamente onde vai parar

Mas não precisamos saber pra onde vamos
Nós só precisamos ir
Não queremos ter o que não temos
Nós só queremos viver
Sem motivos, nem objetivos
Estamos vivos e isto é tudo
É sobretudo a lei
Da infinita highway

Quando eu vivia e morria na cidade
Eu não tinha nada, nada a temer
Mas eu tinha medo, medo dessa estrada
Olhe só, veja você
Quando eu vivia e morria na cidade
Eu tinha de tudo, tudo ao meu redor
Mas tudo que eu sentia era que algo me faltava
E à noite eu acordava banhado em suor

Não queremos lembrar o que esquecemos
Nós só queremos viver
Não queremos aprender o que sabemos
Não queremos nem saber
Sem motivos, nem objetivos
Estamos vivos e é só
Só obedecemos a lei
Da infinita highway

Escute, garota, o vento canta uma canção
Dessas que uma banda nunca canta sem razão
Me diga, garota: será a estrada uma prisão?
Eu acho que sim, você finge que não
Mas nem por isso ficaremos parados
Com a cabeça nas nuvens e os pés no chão
"Tudo bem, garota, não adianta mesmo ser livre"
Se tanta gente vive sem ter como viver

Estamos sós e nenhum de nós
Sabe onde quer chegar
Estamos vivos, sem motivos
Que motivos temos pra estar?
Atrás de palavras escondidas
Nas entrelinhas do horizonte dessa highway
Silenciosa highway

Eu vejo um horizonte trêmulo
Eu tenho os olhos úmidos
Eu posso estar completamente enganado
Eu posso estar correndo pro lado errado
Mas "a dúvida é o preço da pureza"
É inútil ter certeza
Eu vejo as placas dizendo
"não corra, não morra, não fume"
Eu vejo as placas cortando o horizonte
Elas parecem facas de dois gumes

Minha vida é tão confusa quanto a América Central
Por isso não me acuse de ser irracional
Escute, garota, façamos um trato:
Você desliga o telefone se eu ficar muito abstrato
Eu posso ser um Beatle, um beatnik
Ou um bitolado
Mas eu não sou ator
Eu não tô à toa do teu lado
Por isso, garota, façamos um pacto
De não usar a highway pra causar impacto

Cento e dez, cento e vinte
Cento e sessenta
Só prá ver até quando o motor agüenta
Na boca, em vez de um beijo,
Um chiclet de menta
E a sombra do sorriso que eu deixei
Numa das curvas da highway.


(Humberto Gessinger)

domingo, 24 de maio de 2009

3x4

Diga a verdade
Ao menos uma vez na vida
Você se apaixonou
Pelos meus erros

Não fique pela metade
Vá em frente, minha amiga
Destrua a razão
Desse beco sem saída

Diga a verdade
Ponha o dedo na ferida
Você se apaixonou
Pelos meus erros

E eu perdi as chaves
Mas que cabeça a minha
Agora vai ter que ser
Para toda a vida

Somos o que há de melhor
Somos o que dá pra fazer
O que não dá pra evitar
E não se pode escolher

Se eu tivesse a força
Que você pensa que eu tenho
Eu gravaria no metal da minha pele
O teu desenho

Feitos um pro outro
Feitos pra durar
Uma luz que não produz
Sombra

Somos o que há de melhor
Somos o que dá prá fazer
O que não dá pra evitar
E não se pode esconder.


(Humberto Gessinger)

Pra Ser Sincero

Pra ser sincero
Não espero de você
Mais do que educação
Beijo sem paixão
Crime sem castigo
Aperto de mãos
Apenas bons amigos...

Pra ser sincero
Não espero que você
Minta!
Não se sinta capaz
De enganar
Quem não engana
A si mesmo...

Nós dois temos
Os mesmos defeitos
Sabemos tudo
A nosso respeito
Somos suspeitos
De um crime perfeito
Mas crimes perfeitos
Não deixam suspeitos...

Pra ser sincero
Não espero de você
Mais do que educação
Beijo sem paixão
Crime sem castigo
Aperto de mãos
Apenas bons amigos...

Pra ser sincero
Não espero que você
Me perdoe
Por ter perdido a calma
Por ter vendido a alma
Ao diabo...

Um dia desse
Num desses
Encontros casuais
Talvez a gente
Se encontre
Talvez a gente
Encontre explicação...

Um dia desses
Num desses
Encontros casuais
Talvez eu diga:
-Minha amiga
Pra ser sincero
Prazer em vê-la!
Até mais!...

Nós dois temos
Os mesmos defeitos
Sabemos tudo
A nosso respeito
Somos suspeitos
De um crime perfeito
Mas crimes perfeitos
Nunca deixam suspeitos...


(Humberto Gessinger)

sábado, 23 de maio de 2009

Falando Serio

Falando sério
É bem melhor você parar com essas coisas
De olhar p'ra mim com olhos de promessas
Depois sorrir como quem nada quer

Você não sabe
Mas é que eu tenho cicatrizes que a vida fez
E tenho medo de fazer planos
De tentar e sofrer outra vez

Falando sério
Eu não queria ter você por um programa
E apenas ser mais uma em sua cama
Por uma noite apenas e nada mais

Falando sério
Entre nós dois tinha que haver mais sentimento
Não quero seu amor por um momento
E ter a vida inteira p'ra me arrepender.


(Mauricio Duboc / Carlos Colla

Amor Perfeito

Fecho os olhos pra não ver passar o tempo, sinto falta de você
Anjo bom, amor perfeito no meu peito, sem você não sei viver

Vem, que eu conto os dias conto as horas pra te ver
Eu não consigo te esquecer
Cada minuto é muito tempo sem você, sem você

Os segundos vão passando lentamente, não tem hora pra chegar
Até quando te querendo, te amando, coração quer te encontrar

Vem, que nos seus braços esse amor é uma canção
E eu não consigo te esquecer
Cada minuto é muito tempo sem você, sem você

Eu não vou saber me acostumar sem sua mão pra me acalmar
Sem seu olhar pra me entender, sem seu carinho, amor, sem você
Vem me tirar da solidão, fazer feliz meu coração
Já não importa quem errou, o que passou, passou então vem

Vem, vem, vem !


(Michael Sulivan / Paulo Massadas)

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Bobagem

Mais uma briga por causa de amor
Foi sem querer
Talvez seja tarde demais
Pra você relaxar e dar pra mim
Só pra mim bobagem, vem já pra cama
Tá tão quentinho aqui
Bobagem, a gente se ama
Pelos séculos dos séculos
Dos séculos, amém!

(Rita Lee / Lúcia Turnbull)

Não Amo Ninguém

Eu, ontem, fui dormir todo encolhido
Agarrando uns quatro travesseiros
Chorando bem baixinho, bem baixinho, baby
Pra nem eu, nem Deus ouvir
Fazendo festinha em mim mesmo
Como um neném, até dormir

Sonhei que eu caía do vigésimo andar
E não morria
Ganhava três milhões e meio de dollars
Na loteria
E você me dizia com a voz terna, cheia de malícia
Que me queria pra toda vida

Mal acordei, já dei de cara
Com a tua cara no porta-retrato
Não sei por que, que de manhã
Toda manhã parece um parto
Quem sabe, depois de um tapa
Eu hoje vou matar essa charada

Se todo alguém que ama
Ama pra ser correspondido
Se todo alguém que eu amo
É como amar a lua inacessível
É que eu não amo ninguém
Não amo ninguém
Eu não amo ninguém, parece incrível
Não amo ninguém
E é só amor que eu respiro.


(Frejat / Ezequiel / Cazuza)

quinta-feira, 21 de maio de 2009

Obrigada por insistir

Até o mais seguro dos homens e a mais confiante das mulheres já passaram por um momento de hesitação, por dúvidas enormes e dúvidas mirins, que talvez nem merecessem ser chamadas de dúvidas, de tão pequenas. Vacilos, seria melhor dizer. Devo ir a este jantar, mesmo sabendo que a dona da casa não me conhece bem? Será que tiro o dinheiro do banco e invisto nesta loucura? Devo mandar um e-mail pedindo desculpas pela minha negligência? Nesta hora, precisamos de um empurrãozinho. E é aos empurradores que dedico esta crônica, a todos aqueles que testemunham os titubeios alheios e dizem: vá em frente!
"Obrigada por insistir para que eu pintasse, que eu escrevesse, que eu atuasse, obrigada por perceber em mim um talento que minha autocrítica jamais permitiria que se desenvolvesse."
"Obrigada por insistir para que eu fosse visitar meu pai no hospital, eu não me perdoaria se não o tivesse visto e falado com ele uma última vez, eu não teria ido se continuasse sendo regida apenas pela minha teimosia e orgulho."
"Obrigada por insistir para que eu conhecesse Veneza, do contrário eu ficaria para sempre fugindo de lugares turísticos e me considerando muito esperta, e com isso teria deixado de conhecer a cidade mais surreal e encantadora que meus olhos já viram."
"Obrigada por insistir para que eu fizesse o exame, para que eu não fosse covarde diante das minhas fragilidades, só assim pude descobrir o que trago no corpo para tratá-lo a tempo. Não fosse por você, eu teria deixado este caroço crescer no meu pescoço e me engolir com medo e tudo."
"Obrigada por insistir para eu voltar pra você, para eu deixar de ser adolescente e aceitar uma vida a dois, uma família, uma serenidade que eu não suspeitava. Eu não sabia que amava tanto você e que havia lhe dado boas pistas sobre isso, como é que você soube antes de mim?" "Obrigada por insistir para que eu deixasse você, para que eu fosse seguir minha vida, obrigada pela sua confiança de que seríamos melhores amigos do que amantes, eu estava presa a uma condição social que eu pensava que me favorecia, mas nada me favorece mais do que esta liberdade para a qual você, que me conhece melhor do que eu mesma, apresentou-me como saída."
"Obrigada por insistir para que eu não fosse àquela festa, eu não teria agüentado ver os dois juntos, eu não teria aturado, eu não evitaria outro escândalo, obrigada por ficar segurando minha mão e ter trancado minha porta."
"Obrigada por insistir para eu cortar o cabelo, obrigada por insistir para eu dançar com você, obrigada por insistir para eu voltar a estudar, obrigada por insistir para eu não tirar o bebê, obrigada por insistir para eu fazer aquele teste, obrigada por insistir para eu me tratar."
Em tempos em que quase ninguém se olha nos olhos, em que a maioria das pessoas pouco se interessa pelo que não lhe diz respeito, só mesmo agradecendo àqueles que percebem nossas descrenças, indecisões, suspeitas, tudo o que nos paralisa, e gastam um pouco da sua energia conosco, insistindo."



(Martha Medeiros)

A tristeza permitida

Se eu disser pra você que hoje acordei triste, que foi difícil sair da cama, mesmo sabendo que o sol estava se exibindo lá fora e o céu convidava para a farra de viver, mesmo sabendo que havia muitas providências a tomar, acordei triste e tive preguiça de cumprir os rituais que normalmente faço sem nem prestar atenção no que estou sentindo, como tomar banho, colocar uma roupa, ir pro computador, sair para compras e reuniões - se eu disser que foi assim, o que você me diz? Se eu lhe disser que hoje não foi um dia como os outros, que não encontrei energia nem para sentir culpa pela minha letargia, que hoje levantei devagar a tarde e que não tive vontade de nada, você vai reagir como?
Você vai dizer "te anima" e me recomendar um antidepressivo, ou vai dizer que tem gente vivendo coisas muito mais graves do que eu (mesmo desconhecendo a razão da minha tristeza), vai dizer para eu colocar uma roupa leve, ouvir uma música revigorante e voltar a ser aquela que sempre fui, velha de guerra.
Você vai fazer isso porque gosta de mim, mas também porque é mais um que não tolera tristeza: nem a minha, nem a sua, nem a de ninguém. Tristeza é considerada uma anomalia do humor, uma doença contagiosa, que é melhor eliminar desde o primeiro sintoma. Não sorriu hoje? Medicamento. Sentiu uma vontade de chorar à toa? Gravíssimo, telefone já para o seu psiquiatra.
A verdade é que eu não acordei triste hoje, nem mesmo com uma suave melancolia, está tudo normal. Mas quando fico triste, também está tudo normal. Porque ficar triste é comum, é um sentimento tão legítimo quanto a alegria, é um registro da nossa sensibilidade, que ora gargalha em grupo, ora busca o silêncio e a solidão. Estar triste não é estar deprimido.Depressão é coisa muito mais séria, contínua e complexa. Estar triste é estar atento a si próprio, é estar desapontado com alguém, com vários ou consigo mesmo, é estar um pouco cansado de certas repetições, é descobrir-se frágil num dia qualquer, sem uma razão aparente - as razões têm essa mania de serem discretas.
"Eu não sei o que meu corpo abriga/ nestas noites quentes de verão/ e não importa que mil raios partam/ qualquer sentido vago de razão/ eu ando tão down..." Lembra da música? Cazuza ainda dizia, lá no meio dos versos, que pega mal sofrer. Pois é, pega mal. Melhor sair pra balada, melhor forçar um sorriso, melhor dizer que está tudo bem, melhor desamarrar a cara. "Não quero te ver triste assim", sussurrava Roberto Carlos em meio a outra música. Todos cantam a tristeza, mas poucos a enfrentam de fato. Os esforços não são para compreendê-la, e sim para disfarçá-la, sufocá-la, ela que, humilde, só quer usufruir do seu direito de existir, de assegurar o seu espaço nesta sociedade que exalta apenas o oba-oba e a verborragia, e que desconfia de quem está calado demais. Claro que é melhor ser alegre que ser triste (agora é Vinicius), mas melhor mesmo é ninguém privar você de sentir o que for. Em tempo: na maioria das vezes, é a gente mesmo que não se permite estar alguns degraus abaixo da euforia.
Tem dias que não estamos pra samba, pra rock, pra hip-hop, e nem por isso devemos buscar pílulas mágicas para camuflar nossa introspecção, nem aceitar convites para festas em que nada temos para brindar. Que nos deixem quietos, que quietude é armazenamento de força e sabedoria, daqui a pouco a gente volta, a gente sempre volta, anunciando o fim de mais uma dor - até que venha a próxima, normais que somos.


(Martha Medeiros)

quarta-feira, 20 de maio de 2009

É urgente que as pessoas se amem

É urgente que as pessoas se amem
sem vergonha e sem tristeza
Que se amem com orgulho
Com a alegria pagã da joie grega

É urgente que as pessoas não se escondam
por detrás das outras pessoas
das idéias das outras pessoas
dos muros espessos do medo

É urgente que as pessoas se amem

É urgente partilhar o pão e o corpo
com a claridade da terra molhada
nas manhãs de sol

É urgente assumir a verdade.


(Manuela Amaral)

Rebeldia

Soltem-me
as algemas

Quero
a minha alma livre
meu corpo livre
meu pensamento livre

Esbofetear o mundo
e cuspir
na vida.


(Manuela Amaral)

terça-feira, 19 de maio de 2009

Dizer Amor

Queria subir às palavras
e gritá-las
E ter o privilégio de inventar
formas diferentes
de dizer amor.


(Manuela Amaral)

Marés Vivas

Na praia teu corpo
eu sou maré cheia

Em ondas de medo
rebento-me azul

e bebo-te areia.


(Manuela Amaral)

segunda-feira, 18 de maio de 2009

(Des)Cabimento

No mundo cabe verso
Cabe estrada
No mundo cabe
Às dez horas da manhã
Na alta madrugada
Cabe o choro
Na tez da moça triste
Uma deusa pagã

Nas mãos cabe gesto
Cabe sol
Nas mãos cabe
Ternura e uma canção
No olhar distraído
Cabe procura
Na alma intranqüila
A solidão

Na alma cabe desejo
Cabe mágoa
Na alma cabe
Cantatas e paixões
No corpo trêmulo
Cabem charadas
Na falsa indiferença
Razões

Descabimento é esse
Caber o olhar na fresta
Embrenhar o olhar na festa
Pra bailar a sós o amor.


(Carla Dias)

Faltas & Afins

Palavras no cio
Estrelas no céu da boca
A nudez das horas
Debaixo dos cobertores
A voz embargada
O choro contido
A emoção seqüestrada
Dos desamores

A obscena saudade
Atravessa-me afiada.


(Carla Dias)

domingo, 17 de maio de 2009

Simplicidade

Vai diminuindo a cidade
Vai aumentando a simpatia
Quanto menor a casinha
Mais sincero o bom dia

Mais mole a cama em que durmo
Mais duro o chão que eu piso
Tem água limpa na pia
Tem dente a mais no sorriso

Busquei felicidade
Encontrei foi Maria
Ela, pinga e farinha
E eu sentindo alegria

Café tá quente no fogo
Barriga não tá vazia
Quanto mais simplicidade
Melhor o nascer do dia.


(John)

Quase

Ela é quase tudo o que sonhei
E eu sou quase aquilo que sempre evitei
E falhei, sim, falhei
Quase um amor
Quase um caminho
Que me deixou
Quase sozinho
E quase que fiquei contente

E fui feliz pra sempre

No dia em que eu
Quase conquistei seu coração
Quase um amor
Quase um caminho
Que me deixou
Quase sozinho
E apesar de ter ficado

Quase um ano

Quase morto de paixão
Hoje já estou quase bão

Hoje já estou,
Realmente já estou,
Hoje já estou quase bão.


(John)

sábado, 16 de maio de 2009

Todas Elas Juntas Num Só Ser

Não canto mais Babete nem Domingas
Nem Xica nem Tereza, de Ben jor;

Nem Drão nem Flora, do baiano Gil;
Nem Ana nem Luiza, do maior;

Já não homenageio Januária,

Joana, Ana, Bárbara, de Chico;

Nem Yoko, a nipônica de Lennon;
Nem a cabocla, de Tinoco e de Tonico;

Nem a tigreza nem a vera gata
Nem a branquinha, de Caetano;
Nem mesmoa linda flor de Luiz Gonzaga,
Rosinha, do sertão pernambucano;
Nem Risoflora, a flor de Chico Science,
Nenhuma continua nos meus planos.
Nem Kátia Flávia, de Fausto Fawcett;

Nem Anna Júlia do Los Hermanos.

Só você,
Hoje eu canto só você;
Só você,
Que eu quero porque quero, por querer.

Não canto de Melô pérola negra;
De Brown e Hebert, uma brasileira;
De Ari, nem a baiana nem Maria,
Nem a Iaiá também, nem minha faceira;
De Dorival, nem Dora nem Marina
Nem a morena de Itapoã;
Divina garota de Ipanema,
Nem Iracema, de Adoniran.

De Jackson do Pandeiro, nem Cremilda;

De Michael Jackson, nem a Billie Jean;

De Jimi Hendrix, nem a doce Angel;
Nem Ângela nem Lígia, de Jobim;

Nem Lia, Lily Braun nem Beatriz,

Das doze deusas de Edu e Chico;
Até das trinta Leilas de Donato,
E de Layla, de Clapton, eu abdico.

Só você,
Canto e toco só você;
Só você,
Que nem você ninguém mais pode haver.

Nem a namoradinha de um amigo
E nem a amada amante de Roberto;
E nem Michelle-me-belle, do beattle Paul;
Nem Isabel - Bebel - de João Gilberto;

E nem B.B., la femme de Serge Gainsbourg;
Nem, de Totó, na malafemmená;
Nem a Iaiá de Zeca Pagodinho;
Nem a mulata mulatinha de Lalá;

E nem a carioca de Vinícius
E nem a tropicana de Alceu
E nem a escurinha de Geraldo
E nem a pastorinha de Noel
E nem a namorada de Carlinhos
E nem a superstar do Tremendão
E nem a malaguenha de Lecuona
E nem a popozuda do Tigrão

Só você,
Hoje elejo e elogio só você,
Só você,
Que nem você não há nem quem nem quê.

De Haroldo Lobo com Wilson Batista,
De Mário Lago e Ataulfo Alves,
Não canto nem Emília nem Amélia,
Nenhuma tem meus vivas! E meus salves!
E nem Angie, do stone Mick Jagger;
E nem Roxanne, de Sting, do Police;
E nem a mina do mamona Dinho
E nem as mina – pá! - do mano Xiz!

Loira de Hervê e loira do É O Tchan,
Lôra de Gabriel, o Pensador;
Laura de Mercer, Laura de Braguinha,
Laura de Daniel, o trovador;
Ana do Rei e Ana de Djavan,

Ana do outro rei, o do baião

Nenhuma delas hoje cantarei:
Só outra reina no meu coração.

Só você,
Rainha aqui é só você,
Só você,
A musa dentre as musas de A a Z.

Se um dia me surgisse uma moça
Dessas que com seus dotes e seus dons,
Inspira parte dos compositores
Na arte das palavras e dos sons,
Tal como Madallene, de Jacques Brel,
Ou como Madalena, de Martinho;
Ou Mabellene e a sixteen de Chuck Berry,
E a manequim do tímido Paulinho;

Ou como, de Caymmi, a moça prosa
E a musa inspiradora Doralice;
Se me surgisse uma moça dessas.
Confesso que eu talvez não resistisse;
Mas, veja bem, meu bem, minha querida;
Isso seria só por uma vez,
Uma vez só em toda a minha vida!
Ou talvez duas... mas não mais que três...

Só você...
Mais que tudo é só você;
Só você...
As coisas mais queridas você é:

Você pra mim é o sol da minha noite;
É como a rosa, luz de Pixinguinha;
É como a estrela pura aparecida,
A estrela a refulgir, do Poetinha;
Você, ó flor, é como a nuvem calma
No céu da alma de Luiz Vieira;
Você é como a luz do sol da vida
De Steve Wonder, ó minha parceira.

Você é pra mim e o meu amor,
Crescendo como mato em campos vastos,
Mais que a gatinha para Erasmo Carlos;
Mais que a cigana pra Ronaldo bastos;
Mais que a divina dama pra Cartola;
Que a domna pra Ventadorn, Bernart;
Que a honey baby pra Waly Salomão
E a funny valentine pra Lorenz Hart.

Só você,
Mais que tudo e todas, é só você;
Só você,
Que é todas elas juntas num só ser.


(Lenine / Carlos Rennó)

A Rede

Nenhum aquário é maior do que o mar
Mas o mar espelhado em seus olhos
Maior, me causa um efeito
De concha no ouvido, barulho de mar
Pipoco de onda, ribombo de espuma e sal

Nenhuma taça me mata a sede
Mas o sarrabulho me embriaga
Mergulho na onda vaga
Eu caio na rede
Não tem quem não caia

Às vezes eu penso que sai dos teus olhos o feixe
De raio que controla a onda cerebral do peixe

Nenhuma rede é maior do que o mar
Nem quando ultrapassa o tamanho da Terra
Nem quando ela acerta, nem quando ela erra
Nem quando ela envolve todo o planeta

Explode, devolve pro seu olhar
O tanto de tudo que eu tô pra te dar
Se a rede é maior do que o meu amor
Não tem quem me prove

Às vezes eu penso que sai dos teus olhos o feixe
De raio que controla a onda cerebral do peixe

Se a rede é maior do que o meu amor, não tem quem me prove
Eu caio na rede, não tem quem não caia...


(Lenine / Lula Queiroga)

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Eu amo tudo o que foi

Eu amo tudo o que foi,
Tudo o que já não é,
A dor que já me não dói,
A antiga e errónea fé,
O ontem que dor deixou,
O que deixou alegria
Só porque foi, e voou
E hoje é já outro dia.


(Fernando Pessoa)

Durmo, cheio de nada

Durmo, cheio de nada, e amanhã
é, em meu coração,
Qualquer coisa sem ser, pública e vã
Dada a um público vão.

O sono! este mistério entre dois dias
Que traz ao que não dorme
À terra que de aqui visões nuas, vazias,
Num outro mundo enorme.

O sono! que cansaço me vem dar
O que não mais me traz
Que uma onda lenta, sempre a ressacar,
Sobre o que a vida faz?!


(Fernando Pessoa)

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Palavras

Não, tente me enganar
Vejo em seu olhar
Que já não existe
Aquele mesmo amor
Que nunca esperou
Acabar tão triste.

Não tente me dizer
Palavras que eu
Já não acredito
Eu posso compreender
O que restou de um amor
Que foi tão bonito.

Eu fiz daquele amor
O meu sonho maior
Minha razão de tudo
Foi pouco o que restou
De tanto que existiu
Recordações e nada mais.
O que restou, recordações
E nada mais

Não, não vá me dizer
Palavras que venham
Me fazer chorar depois
Eu sei que vou viver
Por muito tempo ainda
Das lembranças de nós dois.


(Roberto Carlos)

Versos Perdidos

As frases são minhas
As verdades são tuas
Enquanto te desejo
Me vejo chorando no meio da rua
Beijo teu sorriso num dia de sol
Que entra pela porta
e canta pela janela

A noite mãe do dia
Molhava tua boca
Na língua da poesia
Oh meu grande amor de versos perdidos
Murmurando na chuva como um refrão
Que só faz sentido
no fundo da cama.


(Zeca Baleiro / Nosly / Fausto Nilo)

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Você é Má

Vá se danar! Você dá nada a ninguém,
Nenhum olhar, nunca falou: tudo bem!
Tem, mas não dá, sorrir jamais lhe convém,
Você é má, mas há de ter um bem!

Você dá nada a ninguém, vá se danar!
Danada não perde o trem, sabe nadar,
Mas nada sabe de alguém que sabe amar,
Eu quero ser seu bem, você é má!

Você é maluca, você é malina,
Você é malandra, só não é massa!
E você magoa, e você massacra,
E você machuca, e você mata!...

Vá se danar, você dá nada a ninguém,
Nunca dará, nem mesmo um simples amém
A Deus dirá, diz que não vai à Belém,
Você é má, mas pode ter um bem!

Você dá nada a ninguém, vá se danar!
Danada finge tão bem, sabe negar
Jamais dará a quem tem demais pra dar,
Mas eu serei seu bem, você é má!


(Zeca Baleiro e Joãozinho Gomes)

O coração do homem-bomba

O coração do homem-bomba faz tum tum
Até o dia em que ele fizer bum.


(Zeca Baleiro)

terça-feira, 12 de maio de 2009

A Primeira Pedra

Atire a primeira pedra
Quem não sofreu, quem não morreu por amor
Todo corpo que tem um deserto
Tem um olho de água por perto

Para ouvir basta abrir os poros
Para aceitar basta oferecer
Para que adiar um desejo
De alguém que lhe quer tanto beijo

Quem de vocês
Resiste a uma tentação
Quem pretende revogar a lei do coração

Quem ousaria
Dessas vozes duvidar
Deixa a sua natureza se manifestar.


(Carlinhos Brown / Marisa Monte / Arnaldo Antunes)

A Alma e a Matéria

Procuro nas coisas vagas ciência
Eu movo dezenas de músculos para sorrir
Nos poros a contrair, nas pétalas do jasmim
Com a brisa que vem roçar da outra margem do mar

Procuro na paisagem cadência
Os átomos coreografam a grama do chão
Na pele braile pra ler, na superfície de mim
Milímetros de prazer, kilômetros de paixão

Vem pra esse mundo, deus quer nascer
Há algo invisível e encantado entre eu e você
E a alma aproveita pra ser a matéria e viver
E a alma aproveita pra ser a matéria e viver.


(Arnaldo Antunes / Carlinhos Brown / Marisa Monte)

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Perspectiva

Tua passagem se fez por distâncias antigas.
O silêncio dos desertos pesava-lhe nas asas
e, juntamente com ele, o volume das montanhas e do mar.

Tua velocidade desloca mundos e almas.
Por isso, quando passaste, caíu sobre mim tua violência
e desde então alguma coisa se aboliu.

Guardo uma sensação de drama sombrio, com vozes de ondas lamentando-me.
E a multidão das estrelas avermelhadas fugindo com o céu para longe de mim.

Os dias que veem são feitos de vento plácido e apagam tudo.
Dispensam a sombra dos gestos sobre os cenários.
Levam dos lábios cada palavra que desponta.
Gastam o contorno da minha síntese.
Acumulam ausência em minha vida...

Oh! um pouco de neve matando, docemente, folha a folha...

Mas a seiva lá dentro continua, sufocada,
nutrindo de sonho a morte.


(Cecília Meireles)

Noite

Úmido gosto de terra,
cheiro de pedra lavada
- tempo inseguro do tempo! -
sombra do flanco da serra,
nua e fria, sem mais nada.

Brilho de areias pisadas,
sabor de folhas mordidas,
- lábio da voz sem ventura! -
suspiro das madrugadas
sem coisas acontecidas.

A noite abria a frescura
dos campos todos molhados,
- sozinha, com o seu perfume! -
preparando a flor mais pura
com ares de todos os lados.

Bem que a vida estava quieta.
Mas passava o pensamento...
- de onde vinha aquela música?
E era uma nuvem repleta,
entre as estrelas e o vento.


(Cecília Meireles)

domingo, 10 de maio de 2009

A Rua

A rua é um rio de passos e de vozes,
um rio terrível que me vai levando,
mas estou só, como se está na infância...
ou quando a morte vai se aproximando...

No ar, agora, que distante aroma?
Decerto eu sem saber pensei em ti...
E um vôo de andorinha na distância
é a minha saudade que eu te mando.

Mas tudo, nesse tumultuoso rio,
não fica nunca ao fundo da lembrança
como no seio azul de uma redoma...

Tudo se afasta nessa correnteza
onde uma flor, às vezes, fica presa
e um claro riso sobre as águas dança!


(Mario Quintana)

A Mensagem

Esse oval do seu rosto, aquelas tranças
tranqüilas, o seu lábio triste e ardente,
luz de vela a tremer em um quarto de doente,
tantos anos depois, eu os vi novamente

numa imagem de altar... Tão linda, parecia
uma Nossa Senhora adolescente
antes da Anunciação, quando era - simplesmente - Maria!

Em instantes de angústia, esta fugaz imagem
de alguém que há muito já se foi - pobre criança! -
timidamente a alma me ilumina...

Dize, que foste tu contar do mundo ao Paraíso?
Por que só podes dar tua mensagem
com a luz silenciosa de um sorriso...

(Mario Quintana)

sábado, 9 de maio de 2009

Essa Mulher

Ela quer viver sozinha
sem a sua companhia
e você ainda quer essa mulher.

Ela goza com o sabonete,
não precisa de você.
Ela goza com a mão,
não precisa do seu pau.

Ela quer viver sozinha,
sem a sua companhia
e você ainda quer essa mulher.

Que não sente a sua falta
e quando você chega em casa ela não sente a sua presença.
Ela tem um travesseiro mais macio do que o seu braço,
e um acolchoado muito mais quente que o seu abraço.

Ela quer viver sozinha
sem a sua companhia
e você ainda quer essa mulher.


(Arnaldo Antunes)

Socorro

Socorro!
Não estou sentindo nada
Nem medo, nem calor, nem fogo
Não vai dar mais pra chorar
Nem pra rir...

Socorro!
Alguma alma mesmo que penada
Me empreste suas penas
Já não sinto amor, nem dor
Já não sinto nada...

Socorro!
Alguém me dê um coração
Que esse já não bate nem apanha
Por favor!
Uma emoção pequena, qualquer coisa!
Qualquer coisa que se sinta...
Tem tantos sentimentos
Deve ter algum que sirva
Qualquer coisa que se sinta
Tem tantos sentimentos
Deve ter algum que sirva...

Socorro!
Alguma rua que me dê sentido
Em qualquer cruzamento
Acostamento, encruzilhada
Socorro! Eu já não sinto nada...

Socorro!
Não estou sentindo nada [nada]
Nem medo, nem calor, nem fogo
Nem vontade de chorar
Nem de rir...

Socorro!
Alguma alma mesmo que penada
Me empreste suas penas
Eu Já não sinto amor, nem dor
Já não sinto nada...

Socorro!
Alguém me dê um coração
Que esse já não bate
Nem apanha
Por favor!
Uma emoção pequena qualquer coisa!
Qualquer coisa que se sinta...
Tem tantos sentimentos
Deve ter algum que sirva.


(Arnaldo Antunes / Alice Ruiz)

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Pagu

Mexo, remexo na inquisição.
Só quem já morreu na fogueira,
sabe o que é ser carvão.
Eu sou pau pra toda obra,
Deus dá asas à minha cobra.
Minha força não é bruta,
não sou freira nem sou puta.

Nem toda feiticeira é corcunda,
nem toda brasileira é bunda.
Meu peito não é de silicone,
sou mais macho que muito homem.

Sou rainha do meu tanque,
sou pagu indignada no palanque.
Fama de porra-louca, tudo bem,
minha mãe é Maria ninguém.

Não sou atriz, modelo, dançarina.
Meu buraco é mais em cima.


(Rita Lee / Zélia Duncan)

Mania de Você

Meu bem você me dá
Água na boca
Hum! Rum!
Vestindo fantasias
Tirando a roupa
Molhada de suor
De tanto a gente se beijar
De tanto imaginar
Imaginar!
Loucuras...

A gente faz o amor
Por telepatia
No chão, no mar, na lua
Na melodia
Mania de você
De tanto a gente se beijar
De tanto imaginar
Imaginar!
Loucuras...

Nada melhor
Do que não fazer nada
Só prá deitar
E rolar com você...


(Roberto de Carvalho / Rita Lee)

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Tua Laçada

Às vezes eu sinto que vou numa estrada
Onde eu sou todo olhos e sentimento
Não trago soluços, pois tenho uma espada
Que corta miragens de um outro tempo

Não é a história que não foi contada
Nem é o estranho sonho do qual despertei
É mais uma espera, mais uma chegada
Ao porto seguro onde eu te encontrei

E é isso que eu sinto com tua laçada
Um abraço tão forte e eu te compreendo
Pois tudo que eu quero é ser tua estrada
Naqueles mergulhos em que tu vens correndo

Pois tudo que eu quero é ser tua estrada
Naqueles mergulhos em que tu vens correndo

Não é o futuro, mas é uma virada
Nosso próximo passo a ser decidido
É como o claro e o escuro da alvorada
E caberá a nós dois saber dividí-lo.


(Zé Ramalho / Frejat)

Paz Nunca Mais

Nunca mais ele teve paz quando viu aquela moça
Imagem viva, perfeita, já feita
Nunca mais ele teve paz quando viu aquela moça
Imagem viva, perfeita, já feita

O seu corpo era o pão que a mão de Deus amassou
Uma criação divina, um anjo que vingou
Todo desejo ao seu dispor
Personificação do amor

Nunca mais ele teve paz quando viu aquela moça
Imagem viva, perfeita, já feita
Nunca mais ele teve paz quando viu aquela moça
Imagem viva, perfeita, já feita

O seu corpo era o nirvana, onde morava o prazer
Lar de tantas fantasias, das teimosias de ter
Desfrutar do que não vê
Do céu da boca ao ponto G

Nunca mais ele teve paz quando viu aquela moça
Imagem viva, perfeita, já feita
Nunca mais ele teve paz quando viu aquela moça
Imagem viva, perfeita, já feita

Por favor compositor eu sou apenas o cantor
Mas....
Devo interferir na trama
Interceder por quem ama
Você pode dar a ele o destino que quiser
Mas prometa que no fim ele fica com a mulher...


(Frejat)

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Túnel do Tempo

Nosso encontro aconteceu como eu imaginava
Você não me reconheceu, mas fingiu que não era nada
Eu sei que alguma coisa minha, em você ficou guardada
Como num filme mudo antes da invenção das palavras

Afinei os meus ouvidos pra escutar suas chamadas
Sinais do corpo eu sei ler nas nossas conversas demoradas
Mas há dias em que nada faz sentido
E o sinais que me ligam ao mundo se desligam

Eu sei que uma rede invisível irá me salvar
O impossível me espera do lado de lá
Eu salto pro alto eu vou em frente
De volta pro presente

Sozinho no escuro nesse túnel do tempo
Sigo o sinal que me liga à corrente dos sentimentos
Onde se encontra a chave que me devolverá
O sentido das palavras ou uma imagem familiar
Mas há dias em que nada faz sentido
E os sinais que me ligam ao mundo se desligam

Eu sei que uma rede invisível irá me salvar
O impossível me espera do lado de lá
Eu salto pro alto eu vou em frente
De volta pro presente...


(Frejat)

Eu Preciso Te Tirar Do Sério

Hoje eu acordei, com vontade de te ver
De te ver
Foi uma noite longa, mas logo estaremos em algum lugar
Aonde ninguém possa nos encontrar

Olha o céu azul, estamos prontos para cair na estrada
Sempre na linha do horizonte, em direção ao sol

Só penso em te encontrar,
Eu preciso te tirar do sério,
E desvendar os teus mistérios...

Hoje eu acordei com vontade de esquecer
De esquecer
Todas as preocupações e ir depressa para algum lugar
Aonde o tempo pareça não existir

Olho o céu azul, estamos prontos pra viver um dia belo
Sempre na linha do horizonte, em direção ao sol

Só penso em te encontrar,
Eu preciso te tirar do sério,
E desvendar os teus mistérios...


(Frejat)

terça-feira, 5 de maio de 2009

Na Dor E No Prazer

Não adiante nem dizer
Pra eu tentar te esquecer
Porque você já está em tudo
Está na dor e no prazer, tente entender
Que mesmo que você me deixe
Igual um peixe fora d'água
E mesmo que você me afogue
Em desilusão e mágoa
Eu vou seguir seus passos à distâncias feito um espião
E vou fingir que tudo não passou de uma desatenção
E que você ainda me ama como eu te amarei
E até o fim de tudo ao teu lado eu sempre estarei
Ah! Por quê? Por quê?
Não consigo viver longe de você
Por quê? Por quê?
Eu dependo, eu preciso de você
E mesmo que você me humilhe
E pise no meu coração
Ainda sim eu não me importo
Eu não suporto é viver sem teu amor
Mesmo que você me ofenda
Que não me ouça e não entenda
Não adianta, pois o meu amor é cego
E já não vê
E tem a paciência de esperar passar a tempestade
E tem a inocência de buscar a tal cumplicidade
E vive eterna adolescência e cultiva essa saudade
De momentos mais românticos, felizes de verdade.


(Paulo Ricardo)

Diz

Diz por que é que você não veio?
Não ve que as flores murcharam.
Depois de um dia e meio?

Por que você não telefonou?
Por que não me bipou?
Não me mandou um e-mail?

O que você fez não se faz não
Se você não quer me ver mais
Não diga que sim quando quer dizer não
Como quem semeia ilusão

Por isso, meu amor, aceite essa canção
De alguém que te esperou em vão

Diz, primeira e ultima vez
Deixa eu ouvir tua voz
Dizer, quem sabe, a verdade

Não, não é preciso chorar
E nem precisa ficar
Me olhando dessa maneira
Talvez você nem saiba o que você faz
E que não tem nada de mais
Você esqueceu, sabe lá o que te deu
Talvez eu não seja capaz

De compreender o amor
Reconhecer os erros
Os erros que são meus e seus

Se por acaso chover
Pode saber que sou eu
Chorando pra te dizer adeus.


(Paulo Ricardo)

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Minha Rainha

Eu sonhei
Que era rei
E você minha rainha.
Quando acordei,
Verifiquei,
Que você não era minha.

Meu coração
Quase parou de dor...
Mas consegui,
Te conquistar
Meu grande amor...

Hoje acordado eu me jugo um rei
Que o sonho que eu tive,
Realizei.
Vivo com você,
Feliz.
A rainha
Que tanto
Sonhei...


(Manacea)

Gotas de saudade

Vai chegar a chuva, a chuva
Molha as minhas mãos
Gotas de saudade de uma paixão
Vem chegando a chuva, a chuva
Molha as minhas mãos
Vozes do passado vem do coração
Nem a distância dos rios
Que correm pro mar
Nem a força do dragão me fará hesitar
Com a distância dos dias que o tempo fará
O sol seu calor, meu amor, vem me guiar, ou não...
Leiloei meu coração
Pra de longe você ver
Não é mais chuva de verão
Pensei em você...


(Luiz Melodia)

domingo, 3 de maio de 2009

De novo

A rotina nos corrói
Já não há ambições
Só há ressentimentos
Em nossos corações
Agora nossos ventos
Vão noutras direções

E o amor, o amor vai nos separar
O amor, o amor vai nos separar
De novo meu bem

Nosso quarto tão frio
E ninguém do meu lado
Como se eu fosse o Rio
E você fosse São Paulo
No entanto eu sinto
Coisas que já não falo

E o amor, o amor vai nos separar
O amor, o amor vai nos separar
De novo meu bem

E nos seus pesadelos
Meus defeitos estão expostos
E quase posso vê-los
Dentro do meu remorso
E o que era tão bom
Já não quero, não posso

E o amor, o amor vai nos separar
O amor, o amor vai nos separar
De novo meu bem

Tudo quer trazer
Você de volta pra mim
Tento te esquecer
Mas vejo que não tem fim, não tem fim.


(Paulo Ricardo / George Israel)

Eu Quero Sempre Voltar

Ouvi
Um som
Me chamar
O vento vem pra me levar
E acender a chama
Pra não me esquecer
Que eu vou voltar pra você

Caminhos que andei
E não te encontrei
Distante não são
Do coração

Correndo com o rio
Voando no ar
A águia me guia
De volta pro lar

Não importa a distância
Nem tempo ruim
Só quero de novo
Ter você junto à mim

Agora eu já sei
Por tudo que eu passei
Nas horas mais difíceis
Em ti eu pensei

Correndo com o rio
Voando no ar
É! A águia nos guia
Ao nosso lugar

Por tantos caminhos
Aprendi a andar
Mas pra você
Quero sempre
Sempre voltar.


(Paulo Ricardo)

sábado, 2 de maio de 2009

Sinto Você

O que posso dizer
é que...

meus lábios
jamais te tocaram
mas consigo sentir

sua boca,
seu corpo,
seu cheiro,
seu calor...

tudo isso fundido
em uma alma,
em um pensamento.

A minha alma
e o meu pensar
que entregues
a um desejo sublime,

tornaram-se (inteiramente)
seus.


(Dênis Rubra)

http://denisrubra.blogspot.com/

Segunda Pausa Para o Amor

Não há por que,
não tem explicação.

Não há como dizer
o impulso da aparição.

É mistério presente
na vida de quem sente.

É presente,
dádiva extrema e reluzente.

Desconhece o tempo
e sabe como chegar.

Não bate na porta
e não avisa quando vai voltar.

É pureza que muda
até o mais vulgar.

É riqueza sem valor
(não há como pagar.)

Não tem saída,
não tem fim.

É não
e é sim.

Redundância ambulante,
combustível do calor.

Ainda tão constante
(acredite)

Chama-se amor!


(Dênis Rubra)

http://denisrubra.blogspot.com/

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Asas Cortadas

Eu, pássaro perdido
Que voou sem medo
Quando era menino
Sério, eu chego a me lembrar
e logo chega o mundo
Pra intimidar
Eles gritam e conseguem me assustar
Eu me sinto gaivota sobre o mar
Que afundou as asas nas manchas de óleo ao mergulhar
E agora não consegue mais voar
Um dia eu vou voar

Sei, sei tudo que posso
Mas vem essa lei
e impõe o ócio
quem tem um olho é rei

Se eu desafiar, incomodarei
Vez em quando bate um vento por aqui
Abro as minhas asas pra tentar subir
Mas com tanto tempo preso a essas grades, me esqueci
E agora tenho medo de cair

Tiê,
Venha das alturas me salvar
No maciço da Tijuca pousará
Onde as nuvens se debruçam
E eu não canso de esperar
Sua liberdade me libertará
Abra as suas asas
Vai sem medo, vai
Vai ganhar o céu
Quem provou da liberdade
não terminará
Preso as próprias grades
Um dia eu vou voar

Eu já vivi no ar
Vem me ver voar.


(Jota Maranhão / Jorge Vercilo)

Filosofia de Amor

Quem por medo do amor que morre
Na hora que o amor percorre
Recua, se afasta e corre
Ouça o conselho que eu lhe dou
É só você morrer de amor
Que a chama do amor não morre

Quem por mágoa de amor se abate
Por medo que o amor maltrate
Ao invés de se dar combate
Ouça o conselho que eu lhe dou
É muito mais cruel a dor
Na casa que o amor não bate

Filosofia de amor não é rei nem doutor
Quem aprende
Só vai sair vencedor de um combate de amor
Quem se rende
Filosofia de amor só não é sabedor
Quem renega
Só vai prender seu amor e virar seu senhor
Aquele que se entrega
E o poeta é o professor
Que ensina todo dia
Filosofia de amor...


(Jota Maranhão / Paulo Cesar Pinheiro / Deusdete Maranhão)

quinta-feira, 30 de abril de 2009

Foi a Saudade

Tentei até demais
Corri, busquei, fui atrás
Mas não consegui te encontrar
Pensei que uma noite seria o bastante
Mas nem só por um instante
Consegui parar de pensar em você

O meu desejo falou mais forte
Peço à vida que dê sorte
E ilumine o meu caminho
Pra que eu possa te encontrar
Vou de novo de amar
E não te perder de vista

Se com você tudo é melhor
Sem você vou de mal a pior
Pra mim não existe vida

Se eu me pego sem você
Posso até me perder
Virar vadio nesse mundo

Foi a saudade que fez
Eu chorar outra vez
E buscar o meu amor
Não, não quero solidão
Só quero a tua paixão
E ser feliz de novo.


(Val Hoffmann)

Devaneio

Mergulhei no mar
E não dava pé
Me apaixonei
Mas não sei por quem
Sonho com alguém
Que você não é

Eu me entreguei demais
Eu imaginei demais
E o silêncio fala mais que a traição
Foi um devaneio meu
Um veraneio seu
E um outono inteiro
Em minhas mãos

Vi um sol nascer
Pelos olhos seus
Me deixei levar
Eu não refleti
Que era a luz dos meus
Refletida em ti

Eu me entreguei demais
Eu imaginei demais
E o silêncio fala mais que a traição

Foi um devaneio meu
Um veraneio seu
E um outono inteiro em minhas mãos


(Jorge Vercilo)

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Pra rua me levar

Não vou viver como alguém que só espera um novo amor
Há outras coisas no caminho aonde eu vou
As vezes ando só, trocando passos com a solidão
Momentos que são meus e que não abro mão

Já sei olhar o rio por onde a vida passa
Sem me precipitar e nem perder a hora
Escuto no silêncio que há em mim e basta
Outro tempo começou pra mim agora

Vou deixar a rua me levar
Ver a cidade se acender
A lua vai banhar esse lugar
E eu vou lembrar você


É... mas tenho ainda muita coisa pra arrumar
Promessas que me fiz e que ainda não cumpri
Palavras me aguardam o tempo exato pra falar
Coisas minhas, talvez você nem queira ouvir

Já sei olhar o rio por onde a vida passa
Sem me precipitar e nem perder a hora
Escuto no silêncio que há em mim e basta
Outro tempo começou pra mim agora

Vou deixar a rua me levar
Ver a cidade se acender
A lua vai banhar esse lugar
E eu vou lembrar você...


(Ana Carolina / Totonho Villeroy)

Nada Te Faltará

Pra onde vamos
As vans, carros e bicicletas?
Certezas avessas
Comércio de guerra
Legado de merda

Mais de um bilhão de chineses
Marchando sem deuses
E outros descalços
Fazendo sapatos
Pra nobres e ratos

Sobe do solo
A nuvem de óleo com cheiro
De enxofre queimado
Fudendo com os ares
E outras barbáries

Quero mudança total
Uma idéia genial
A ciência e o amor
A favor do futuro
Quero o claro no escuro

Peço paz aos filhos de abraão
Quero gandhi na melhor versão

E nada vai me faltar, e nada te faltará
E nada vai me faltar, e nada te faltará

Pra onde seguem os barcos?
Os homens, suas trilhas
Seus filhos e filhas
No pau da miséria?
Um pico na artéria

As mulheres pedintes perdidas
Que já quase loucas
Dividem o frio da noite
Com as drags
As mães e os "carregues"

Meninas sangrando na boca
E no meio das pernas
No meio da noite
Tomando cacete
Sem dente, sem leite

Quero respeito
Os humanos direitos
Fazendo pensar os pilares
De uma nova era
Que não seja quimera

Peço paz aos filhos de abraão
Quero gandhi na melhor versão

E nada vai me faltar, e nada te faltará.


(Ana Carolina / Antônio Villeroy)

terça-feira, 28 de abril de 2009

De noite na cama

De noite na cama
Eu fico pensando
Se você me ama
E quando

Se você me ama
Eu fico pensando
De noite na cama
E quando

De dia eu faço graça
Pra não dar bandeira
Não deixo você ver
De dia tudo passa
Como brincadeira
Por longe de você

Por onde você mora
Parece demora
Por hora não vou ter
Coragem de dizer
Mas há de haver a hora
Se você for embora
Agora.


(Caetano Veloso)

Coisas que não se esquece

Mexendo no meu passado
Aperto em minhas mãos
Velhas cartas já marcadas
Pelo tempo antigas fotograficas
Quase já sem cor
Em um momento de saudade
Nessa lagrima de amor
são coisas que não se esquece
Só finge quem desconhece
Não dá pra esconder verdades
Sobre o que ficou
São coisas que não se esquece
E mesmo que eu quisesse
As fotos não negam os fatos
Do que se passou
com tantas lembranças suas
Tenho que viver
E até quando eu não quero
Lembro de você
Momentos inesquecíveis
Nosso amor deixou
No mais intimos de nós
Essa história que ficou
São coisas...que se passou.


(Mauro Motta / Eduardo Ribeiro)

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Sobre Praias

Vem agora, ó bem-amada...

Dentro de mim,
mora uma praia ensolarada,
um mar imenso e algumas vagas.

Às vezes, tu mesma
surges dessas águas
e vais à areia me namorar.

Mas o carinho, que me dás,
ó bem-amada,
tem o peso da tua ausência...

(tua boca, ainda molhada,
tem o sabor das minhas lágrimas...)


(Filipe Couto)

http://asoutraspalavras.blogspot.com/

Sobre Partidas

Vais porque és todo mar,
e já não te contentam
minhas praias desertas,
repletas só de areia, só de mim.

Vais porque és todo vento,
e já não te contentam
meus portos (assim seguros,
assim bentos, assim sem fim).

Mas antes desta nova partida,
deita um pouco no meu colo,

faz teu mar
dos meus olhos,

torna meus braços
teu barco

(e leva, com todo cuidado,
um sonho meu pra navegar).


(Filipe Couto)

http://asoutraspalavras.blogspot.com/

domingo, 26 de abril de 2009

Sobre Covardias

Fecha os teus olhos e escuta essa chuva
que (tão calma...) tudo inunda.

Agora escuta (atento)
o lamento do vento nos vidros
e respira fundo o frio todo que faz lá fora.

Aproveita, vai aí dentro do teu peito
e me procura naquele breve espaço
escondido entre a culpa e o desejo.

E se você, por acaso, me encontrar,
por favor, me arranca de lá...

(um coração que, por medo, não sangra
não pode nunca ser o meu lar)


(Filipe Couto)

http://asoutraspalavras.blogspot.com/